No último fim de semana, jornais, revistas e TV discutiam, especulavam a descreviam a Operação Navalha (continuamos viciados nos editores de realidade). Mais uma operação da Polícia Federal que desmascarou um grupo organizado de pessoas, mas desta vez se tornou emblemática - segundo o polêmico Diogo Mainardi, comentarista do Manhatan Conection e colunista da Veja - já que envolveu pessoas de praticamente todas as camadas institucionais. Empresários, donos de empreiteira, advogados, secretárias, lobistas, assessores (sempre eles) de parlamentares, órgãos responsáveis por liberação de verbas, órgãos responsáveis por fiscalização de obras e os próprios parlamentares como o presidente do Senado.
Com uma transparência impressionante, todo o fluxo de como o desvio de verbas públicas acontecia tornou-se público. É possível saber exatamente o papel de cada um, desde o presidente do Senado até a secretária do dono da empreiteira. Uma eficiência operacional digna de empresas de primeiro mundo pode-se dizer.
Apesar de nos últimos tempos, várias operações destas terem sido desnudadas, pouco de prático têm acontecido como a prisão efetiva dos responsáveis. Desde 2003, vinte grandes operações de combate a corrupção foram feitas. Somente 6%, ou 40 pessoas permanecem presas contra 785 detidas durante as operações, segundo levantamento do jornal O Globo.
Outro ponto interessante levantado pelo colunista André Perry da Veja é que esta operação estava a todo vapor com uma intensa sensação de impunidade dos seus participantes, como identificado no teor das gravações, enquanto a imprensa noticiava outras operações sendo desmascaradas com o mesmo grau de pirotecnia como a Operação Sanguessuga .
Ou seja, não parece que a imprensa têm sido capaz de inibir os corruptores divulgando esquemas de corrupção sendo desmascarados.
Mas, o que mais chamou atenção na mídia foi a preocupação em mostrar os efeitos práticos da corrupção. As imagens dos envelopinhos recheado passando de mãos flagradas por câmeras de seguranças estão sendo expostas ao lado de famílias sem água e luz isoladas em áreas inóspitas. Estima-se em 1.5 bilhão de reais o valor deixado na mesa da corrupção na economia do Brasil. Já existe uma intenção de mostrar conexão de causa e efeito, talvez o melhor formato de impactar a opinião pública.
Recentemente, uma campanha sobre pirataria foi veiculada nos cinemas e TV. O filme procura interligar o ato (crime) de comprar filme pirata ao crime de assalto no transito, uns dos mais freqüentes atos de violência do nosso tempo. Causa e efeito são colocados lado a lado de forma impactante, procurando inibir o ato de comprar filmes piratas, a primeira vista um ato inofensivo. O filme Traffic com o Michael Douglas também foi um clássico ao explicitar as relações de causa e efeito do mundo das drogas nos EUA.
Sim, parece que estamos aos poucos percebendo que há mais interligações entre as coisas do que somos capazes de perceber. Na verdade, tudo está relacionado. Nós é que com tempo perdemos a capacidade de perceber as conexões.
Se estivermos realmente ligados a nossa essência espiritual, experimentaremos desconforto ao comprar coisas de origem duvidosa, desmatar áreas com árvores seculares ou investir em ações de empresas claramente danosas ao meio ambiente ou que lucram com guerras?
A espiritualidade também traz um senso de pertencer a algo maior. Um senso de que individualmente podemos fazer a diferençam em contraste a baixa auto-estima de fazer porque todo mundo faz ou de achar que não fazemos diferença individualmente ou até de fazer porque alguém iria acabar fazendo.
A tecnologia e o ciberespaço são grandes aliados dessa emancipação do Ser Humano. Elas trazem espiritualidade na medida em que conectam pessoas e informações explicitando nossa interdependência, a dos fatos e, ao gerar transparência. Nunca, na história da humanidade tivemos uma ferramenta tão poderosa na capacidade de comunicar muitos com muitos como a Internet.
Vamos imaginar uma interface tecnológica tão lúdica e poderosa como o Windows, o Playstation ou mesmo o Google que fosse capaz de imediatamente fazer surgir na nossa frente o efeito em cadeia de um ato como desviar recursos públicos. Como uma planilha do Excel que muda resultados a partir da alteração de valores que estejam interligados por formulas, uma tecnologia que “descobrisse” quais imagens sensibilizariam nossas mentes em tempo real (talvez pelas mais recentes buscas no Google?) sobre os efeitos de nossos atos.
Na onda da sustentabilidade, as calculadoras de impacto pessoal de carbono são uma prova interessante de onde podemos chegar.(O próprio conceito de sustentabilidade remete a conexão de tudo já que o carbono, seqüestrado ou emitido está presente em toda parte)
Imagine o Zuleido (o cabeça da “operação Navalha”), sua família e amigos sendo bombardeado em tempo real por imagens em seu celular, na tela do computador, nas TVs de sua casa, ou do seu barco das conseqüências dos desvios de verba. Imagens do futuro do país, dos seus filhos, de alguma coisa importante para ele (deve existir) que seria prejudicada em conseqüência da distribuição dos envelopes não transparentes.
Talvez a imagem mais simples de entender seria mesmo a do seu pé sangrando após ser alvejado por um tiro saído de uma arma em seu punho.